Perícias em sede de Direito Penal
1.1 A Perícia prevista no art.º 159º do Código de Processo Penal
Na maioria dos casos, o objecto de perícia reduz-se à avaliação de pressupostos médico-legais de (in)imputabilidade do agente à data da práctica dos factos (ilícitos) cometidos, em virtude de anomalia psíquica (art. 20º do C.P.).
Esta perícia é legalmente atribuída a um psiquiatra, devendo este, em última análise, pronunciar-se se, “em razão de anomalia psíquica”, existia prejuízo da capacidade de avaliação e de determinação quando e para os factos (concretos) em apreciação.
O psiquiatra poderá solicitar a colaboração de outros especialistas para elaborarem exames complementares, nomeadamente psicólogos (para avaliarem o processamento cognitivo), neuroimagiologistas (para interpretar uma TAC-CE ou uma RMN-CE), neurofisiologistas (para leitura e interpretação de um EEG), neurocirurgiões ou neurologistas para enquadramento de um traumatismo craniano, tumor cerebral, epilepsia ou quadro demencial.
1.2 A Perícia prevista no art. 160º do Código de Processo Penal
Neste caso pretende-se avaliar as características psíquicas independentes de causa patológica, bem como analisar o grau de socialização. Esta perícia visa assessorar o tribunal em fase ulterior e em questões especificas, nomeadamente conhecer a maneira de ser daquele cidadão, para aplicação de uma sanção judicial, medida da pena, e eventual revogação de uma prisão preventiva. Para além da patologia psiquiátrica – de enfoque psiquiátrico – deverão ser analisados outros aspectos para os quais os psicólogos estão mais habilitados, devendo ser estes técnicos preferencialmente (mas não exclusivamente) escolhidos para a realização da avaliação pericial.
Estas perícias são habitualmente requeridas em casos de crime de homicídio, ofensa à integridade física, maus tratos, violação, furto/roubo, abuso sexual de menor ou de pessoa incapaz de resistência, e podem ser requeridas ao alegado arguido/agressor, bem como à alegada vítima.
1.3 A perícia prevista no art. 131º do Código do Processo Penal
O art. 131º do C.P.P. explixita que “A autoridade judiciária verifica a aptidão física ou mental de qualquer pessoa para prestar testemunho, quando isso for necessário para avaliar da sua credibilidade”. Nesse sentido, o perito deve pronunciar-se (apenas) sobre a capacidade da pessoa em causa para prestar depoimento, ou seja, a capacidade de conservar em memória e reproduzir os acontecimentos que presenciou, nomeadamente sobre os aspectos perceptivos e cognitivos do depoimento, e não sobre a sua credibilidade; este juízo pertence, inexoravelmente, ao tribunal.
Sendo necessária a avaliação instrumental de processos cognitivos e intelectivos, i.e. atenção, memória, processamento da informação, raciocínio, será muito provavelmente necessária a intervenção do (neuro)psicólogo para complementar a avaliação psiquiátrica. Quando a situação envolva eventual patologia (neuro)psiquiátrica, deverá ser o psiquiatra a pronunciar-se, ainda que auxiliado por parecer de neurologista e eventuais exames complementares.
1.4 A perícia prevista no art. 52º do decreto-lei 15/93, de 22 de janeiro
O conteúdo desta perícia assemelha-se à perícia prevista no art. 159º do C.P.P., pretendendo-se também valorar a natureza dos produtos consumidos para a avaliação dos pressupostos médico-legais de (in)imputabilidade.
Esta perícia poderá implicar a pesquisa de determinadas substâncias estupefacientes em tecidos biológicos, mas envolver também uma discussão abrangente relativamente a aspectos bioquímicos e psicofarmacológicos, o que habitualmente está reservado aos psiquiatras.
1.5 A perícia para avaliação do dano em direito penal
Em direito penal importa ao magistrado a tipificação do crime (se a ofensa à integridade será simples ou agravada pela presença de uma anomalia psíquica grave ou incurável) para poder ser realizada uma acusação, ou graduada uma pena. Se o pretendido for a quantificação de um défice cognitivo pós-traumático (por exemplo após crime de agressão) em que exista dúvida quanto à presença de uma patologia (neuro)psiquiátrica como sequela, deverá o psiquiatra elaborar um diagnóstico diferencial entre uma perturbação de stress pós-traumático, uma reacção de adaptação ou uma síndrome cerebral orgânica pós-traumática, quantificando as lesões resultantes, o que poderá ser feito em contexto de avaliação neuropsiquiátrica, idealmente ombro-a-ombro, com a intervenção de psiquiatra e neurologista.